O Painel de Indicadores da Educação Especial, produzido pelo Instituto Rodrigo Mendes e divulgado recentemente, traz um retrato claro da situação na Bahia em 2024: 181.734 matrículas ativas na educação especial, o que representa 5,3% dos mais de 3,4 milhões de alunos das redes estaduais, municipais, públicas e privadas.
Um crescimento visível
Esse número não surgiu do nada. Em 2007 a participação da educação especial era de apenas 0,8% — 32.546 alunos entre mais de 4,3 milhões. Em pouco mais de uma década e meia houve um salto de cerca de quatro pontos percentuais e um acréscimo de mais de 140 mil matrículas em termos absolutos. Por que isso importa? Porque mostra avanço no reconhecimento das necessidades, mas também expõe lacunas no atendimento.
Quem são esses estudantes?
O perfil traçado pelo levantamento aponta tendências claras:
- Predomínio do sexo masculino: 67,22%.
- Maioria autodeclarada parda: 58,6% (17,55% sem registro de cor/raça; 11,7% brancos; 11,3% pretos).
- Por etapa: maior concentração no ensino fundamental — 34,7% nos anos iniciais (1.º ao 5.º) e 28,8% nos anos finais (6.º ao 9.º).
- Rede municipal concentra cerca de 76,9% das matrículas, incluindo creches (4,5%) e pré‑escolas (10,3%).
Outras fatias: 11,2% no ensino médio, 10% no EJA e 0,4% na educação profissional. Em termos etários, 69% têm até 14 anos; 16,1% entre 15 e 17 anos; e 9,2% entre 18 e 24 anos.
Tipos de deficiência
A distribuição por tipo mostra concentrações claras:
- Deficiência intelectual: 52,5%.
- Autismo: 26,3%.
- Baixa visão: 7,6%.
- Limitações motoras: 6,0%.
- Deficiência múltipla: 3,8%.
- Deficiência auditiva: 1,9%; surdez: 0,6%; cegueira: 0,2%; altas habilidades/superdotação: 1%. Não foram registrados casos de surdocegueira.
Infraestrutura e serviços
O painel também mapeou recursos físicos e serviços nas escolas. Os números mostram que muitos espaços ainda não estão preparados:
- Salas de recursos multifuncionais (SRM): 25,1% das unidades de educação básica.
- Rampas de acesso: 57,6%.
- Banheiros adaptados: 54,8%.
- Vão livre: 43,4%.
- Itinerários menos presentes: sinais sonoros (3,4%), elevadores (5%) e sinais táteis (5,3%).
Sobre o Atendimento Educacional Especializado (AEE): 45,85% dos estudantes da educação especial estavam matriculados no serviço. A grande maioria, 99,1%, frequentava classes regulares, enquanto 0,9% estava em classes especiais.
Professores e formação
Em 2024 a Bahia tinha 170.786 professores atuantes, dos quais 167.368 eram regentes. Entre esses regentes, apenas 5% possuíam formação continuada específica em Educação Especial — um avanço tímido desde 2% em 2012 (apenas 3 pontos percentuais em 13 anos). Entre os docentes que atuam diretamente no AEE, 37% tinham formação continuada, abaixo dos 41% observados no início da década.
Dentre os mais de 160 mil regentes, 5.144 atuavam no AEE em 2024. O levantamento também registrou cerca de 28 mil profissionais de apoio na rede — número que atende aproximadamente 26% dos estudantes da educação especial. Entre esses profissionais, havia 223 intérpretes de Libras, com média de atendimento de 24 alunos por intérprete.
Vozes e explicações
Alexandre Fontoura, coordenador de Educação Especial da Secretaria de Educação do Estado, explicou medidas em curso: abertura de salas de recurso na rede estadual e exigência de formação específica de 360 horas para professores que atuem nessas salas.
“O que a gente tem feito é fomentar, na rede [estadual], a abertura de salas de recurso […], onde a gente tem exigido a formação específica dos professores que vão atuar, que seja de 360 horas para que a gente tenha a qualidade nesse atendimento dos estudantes.” — Alexandre Fontoura
Uma nota técnica do Ministério da Educação lembra que o AEE deve identificar, elaborar e organizar recursos pedagógicos e de acessibilidade para eliminar barreiras à participação plena dos alunos.
A professora e pesquisadora Sheila Quadros Uzêda, da Faculdade de Educação da UFBA, aponta fatores que ajudam a entender a baixa adesão às formações: infraestrutura inadequada em algumas escolas; falta de materiais e mobiliário nas SRM; sobrecarga e excesso de responsabilidade sobre o professor especialista; e oferta de cursos que, por vezes, não articulam teoria e prática.
Conclusão e encaminhamentos
O painel evidencia um quadro duplo: crescimento no número de estudantes identificados na educação especial e, ao mesmo tempo, desafios concretos — formação docente ainda limitada, salas e recursos insuficientes e cobertura do AEE desigual. Como resposta, a Secretaria estadual anunciou a abertura de vagas de formação e ações de fomento às SRM, medidas que o coordenador vê como peças-chave para ampliar a capacidade de atendimento.