A Polícia Federal (PF) encontrou no celular do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), apreendido em maio de 2023, indícios de uma rede de articulação política mantida com parlamentares e empresários. As revelações cobrem o primeiro ano do atual governo federal, de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e foram extraídas de 7.268 arquivos, incluindo mensagens de WhatsApp, áudios e documentos.
Conteúdo da Apuração
O material analisado pela PF se concentra em diálogos de uma semana antes da apreensão do aparelho, que ocorreu em 3 de maio de 2023, durante uma operação relacionada a fraudes em certificados de vacinação contra a Covid-19. Registros anteriores no dispositivo teriam sido apagados e não foram recuperados pelas autoridades.
Um dos trechos investigados mostra Jair Bolsonaro orientando o deputado federal Hélio Lopes (PL-RJ) a assinar um requerimento para a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) com o objetivo de investigar ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), entre eles Alexandre de Moraes. Em áudio datado de 26 de abril de 2023, Lopes manifesta preocupação com as possíveis consequências políticas da sua adesão:
“A galera tá me pressionando… eu não queria entrar nessa bola dividida, com medo de prejudicar até o senhor mesmo.”
Bolsonaro respondeu ao deputado, encorajando a ação:
“Eu assinaria. Sempre existe a possibilidade de retaliações.”
Em seguida, Lopes confirma que assinou o requerimento. A proposta original da CPI, que buscava apurar supostos abusos de autoridade do STF e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), foi apresentada em 2022 pelo deputado Marcel Van Hattem (Novo-RS) e tentou ser reativada por parlamentares bolsonaristas em 2023, mas não foi instalada.
Mobilização e Protestos
As mensagens revelam ainda que, em abril de 2023, Bolsonaro orientou seu filho, o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), a atuar contra o Projeto de Lei 2.630/2020, conhecido como PL das Fake News. O ex-presidente monitorava de perto a tramitação do projeto, pressionando por sua rejeição no plenário da Câmara dos Deputados. Em 2 de maio, Eduardo Bolsonaro informou que o relator, deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), havia pedido a retirada da pauta. Bolsonaro, então, cobrou:
“Tem que votar hoje.”
Eduardo Bolsonaro afirmou ter se posicionado a favor da votação como líder da minoria. Além disso, as conversas indicam que o ex-embaixador de Israel no Brasil, Yossi Shelley, teria oferecido financiamento para uma viagem internacional de Bolsonaro ao país em 2023.
Em um episódio relacionado, o deputado Hélio Lopes organizou um protesto simbólico em frente ao STF, na Praça dos Três Poderes, utilizando esparadrapo na boca em crítica a decisões judiciais impostas a Bolsonaro por Alexandre de Moraes. A manifestação foi desmobilizada por ordem do ministro, que justificou a medida como uma forma de prevenir ocorrências semelhantes aos eventos de 8 de janeiro. No dia seguinte, a praça foi isolada com grades.
A defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro não se manifestou sobre o conteúdo das conversas.