Em Sobradinho (DF), um homem autodenominado Pai de Santo é investigado por dopar, estuprar, ameaçar e coagir ao menos cinco vítimas — incluindo uma adolescente de 17 anos — entre maio de 2024 e junho de 2025. Ele simulava “incorporação” de Zé Pilintra para justificar estupros como se fossem demandas da entidade espiritual. O caso revela como pessoas em busca de acolhimento religioso podem se tornar alvos de violência (PCDF).
O que você precisa saber
Vulnerabilidade como porta de entrada
O acusado se apresentou como líder religioso, ofereceu chá, suco e abrigo aos frequentadores. Em alguns casos, convidou mulheres para passarem fins de semana na propriedade rural onde funcionava o terreiro — uma cena comum em ambientes de fé que, no DF, acabou sendo arma para o crime. Diversas vítimas buscavam apoio espiritual e acabaram manipuladas.
A farsa da incorporação
Segundo relatos, ele sussurrava à vítima:
“O Zé já me falou que você quer”
Utilizando a autoridade simbólica da entidade Zé Pilintra — figura respeitada na umbanda e no Catimbó — justifica os estupros como “ordens espirituais” .
Chá “batizado” e coação
Em um dos casos, vítima e filha passaram a madrugada no terreiro. Ela acordou com cólicas e sangramento, mesmo tendo ingerido apenas um gole. Durante a noite, foi surpreendida com o pai de santo nu sobre ela; ao perceber que a jovem estava consciente, ele a tapou. No dia seguinte ameaçou-a: se contasse, “iria pagar”, que cinicamente faria “macumba para matar” o irmão dela. Os abusos se repetiram por semanas.
Ameaças e invasão de privacidade
Outra vítima relatou abusos não só no terreiro, mas também dentro da loja de artigos religiosos do suspeito e até em sua própria casa. Ele enviava mensagens via WhatsApp, dizia ter “hackeado” o celular da mulher e a amarrava com um cinto — tudo sob pretexto de “ensinar algo”. A vítima teve de mudar de cidade para fugir da perseguição.
Uma farsa em nome da fé
O investigado, que dizia se chamar Pai Leandro de Oxossi (Leandro Mota Pereira), nega as acusações. Por meio de nota, afirmou não ter dopado ninguém e garantiu que as mulheres “nunca ficaram sozinhas comigo” e que “jamais houve estupro” (Metropoles).
Zé Pilintra e sua autoridade espiritual
Zé Pilintra é uma das entidades mais respeitadas nos cultos afro-brasileiros — Catimbó e Umbanda — especialmente no Nordeste, incluindo Bahia. Ele é visto como protetor e “Advogado dos Pobres” e muito presente em giras. Usar seu nome como justificativa para abusos é uma forma de manipulação que engana quem confia nas práticas religiosas (Wikipédia Zé Pelintra).
Alerta Bahia: uma fé plural, mas vulnerável
A Bahia concentra uma das tradições mais fortes de religiões de matrizes africanas no país. O caso do DF mostra que, mesmo em ambientes espirituais consolidados, a desigualdade, o isolamento ou a crise podem tornar praticantes vulneráveis a líderes com intenções malignas:
- Muitas vítimas procuraram o terreiro por apoio, cura emocional ou conexão espiritual — algo comum também em terreiros baianos.
- Conhecer os sinais de alerta pode proteger pessoas que buscam fortalecimento da fé e acabam desamparadas justamente ali.
Como se proteger e orientar quem frequenta terreiros:
1. Procure referências e indicações confiáveis
Terreiros que funcionam em rede comunitária ou com estrutura conhecida têm menor risco de (auto)denominar-se legitimidade.
2. Nunca aceite ficar sozinho com o médium
Estar acompanhado por mais filhos ou pessoas confiáveis é um mínimo de segurança.
3. Desconfie de isolamento e privações
Ofertas de hospedagem com bebidas ou alimentos não solicitados podem ser tentativas de controle químico.
4. Fique atento a discursos que misturam autoridade espiritual com exigência sexual
Se uma entidade espiritual é usada como justificativa para relações sexuais, há alto risco de abuso.
5. Denuncie na política ou delegacia especializada
O caso se encontra sob investigação da Polícia Civil do Distrito Federal; em sua cidade, procure a delegacia da mulher ou órgãos de proteção à mulher.
Além do fato, o alerta
O mais recente desdobramento desse caso — que corre na PCDF — é uma confirmação de que crimes sexuais podem se camuflar em devotamento religioso. As testemunhas devem ser ouvidas, e novas vítimas ainda podem surgir. O alerta não vale apenas para o DF: onde houver fé expressa em ritmo de proximidade no terreiro, Bahia incluída, é preciso manter diálogo comunitário, empoderamento e fiscalização interna.
Esta é uma reportagem de alerta e informação. A fé faz parte da história do Brasil, mas não deve ser terreno fértil para criminosos.