Uma investigação do Greenpeace Brasil, divulgada à imprensa na segunda‑feira (29), ligou a JBS a compras de gado que teriam relação com irregularidades ambientais e trabalhistas na região de Santana do Araguaia (PA).
O que o relatório encontrou
Segundo o levantamento, duas propriedades — a Fazenda Nova Orleans e a Chácara Rancho Alegre — teriam funcionado em conjunto. A Nova Orleans estava registrada no nome de Mário Biernaski e a chácara em nome de Tania Biernaski. Entre dezembro de 2018 e agosto de 2023, teriam sido transferidos 1.901 bovinos da Fazenda Nova Orleans para a Chácara Rancho Alegre, que tem 64 hectares.
A investigação descreve a possível utilização da chácara como um ponto de passagem para animais da fazenda maior — uma prática conhecida na área como “triangulação” ou, nas palavras do relatório, parte do esquema de “lavagem de gado” para ocultar pendências ambientais e trabalhistas.
Histórico da Fazenda Nova Orleans
A Fazenda Nova Orleans tem mais de 10 mil hectares e um histórico de autuações. O relatório cita:
- Embargo do Ibama em 2011 por desmatamento ilegal de mais de 1.168 hectares e multa de R$ 8,7 milhões à época;
- Segundo embargo em 2018 por outros 534 hectares;
- Inclusão na Lista do Desmatamento Ilegal do Pará por um corte de 164 hectares em 2013;
- Resgate de 29 trabalhadores em condições análogas à escravidão em 2005;
- Alteração de limites no Cadastro Ambiental Rural entre 2018 e 2019, reduzindo em 31% a sobreposição com áreas de desmatamento;
- Classificação como “inapta” pela plataforma Selo Verde do governo do Pará.
O papel da Chácara Rancho Alegre
O relatório afirma que a Chácara Rancho Alegre apresentou desmatamento não autorizado de 17,6 hectares posterior a 2008. Entre 2018 e 2023, a chácara registrou fluxo de mais de 4.174 animais, com taxa média de lotação de 10,08 cabeças por hectare por ano — bem acima do indicador de risco de 3 cabeças/ha/ano usado pelo Ministério Público Federal. Esses números aumentam as suspeitas de que a chácara tenha servido para legalizar a origem do gado.
Isso tudo levanta uma pergunta óbvia: como um terreno de 64 hectares recebeu quase 1.901 animais transferidos em poucos anos e teve um fluxo total de mais de 4.174 cabeças entre 2018 e 2023? Para o Greenpeace, os dados apontam para práticas que permitiriam ocultar problemas ambientais e trabalhistas.
Relação com a JBS
O relatório também conecta a chácara a frigoríficos da região. Documentos da marca Friboi mostram 129 entregas da Chácara Rancho Alegre ao frigorífico entre 2018 e 2024. Em um período específico, entre maio de 2022 e março de 2023, foram enviados 841 bois da chácara para abate na JBS.
Segundo a investigação, essas transferências e registros teriam possibilitado a chamada “lavagem de gado”, usando a chácara como fachada para animais originários da Fazenda Nova Orleans.
Posicionamento da JBS
“A JBS afirmou que as aquisições listadas estavam alinhadas às suas políticas e aos protocolos do setor, informou que bloqueou preventivamente a Chácara Rancho Alegre e solicitou esclarecimentos ao fornecedor, e declarou que a Fazenda Nova Orleans já constava bloqueada em seu sistema desde 2014”, disse a empresa, segundo o relatório do Greenpeace.
Além disso, a JBS comunicou ter feito o bloqueio preventivo da chácara, solicitado esclarecimentos ao produtor, afirmar que monitora 100% dos fornecedores diretos e que investe em programas de rastreabilidade no Pará.
Resumo
Em linhas gerais, o Greenpeace vinculou a JBS à compra de gado oriundo de propriedades com histórico de desmatamento e trabalho escravo em Santana do Araguaia (Pará). O relatório reúne transferências, autuações e documentos que, segundo os investigadores, apontam para práticas usadas para ocultar pendências ambientais e trabalhistas. Resta agora acompanhar as investigações e as providências das autoridades e da própria empresa.