Um domingo que amanheceu mais pesado
No primeiro sussurro de 20 de julho, São Paulo acordou com a notícia: José Maria Marin, ex-presidente da CBF e uma das figuras mais controversas do nosso esporte, morreu aos 93 anos. Sentiu-se mal em casa no sábado à noite, foi levado ao Hospital Sírio-Libanês e partiu às 3h30. A família não divulgou a causa; médicos lembram apenas que, desde um AVC no fim de 2023, a saúde do cartola já vinha cambaleando. O velório, breve e discreto, ocorreu na Funeral Home, das 13h às 16h.
Entre plenários e arquibancadas — que currículo é esse?
Formado em Direito, Marin mergulhou na política ainda nos anos 1960, eleito vereador pelo PRP. Logo depois, abraçou a Arena, partido de sustentação do regime militar, e foi subindo os degraus até virar vice-governador de São Paulo na gestão Maluf. De maio / 82 a março / 83, sentou na cadeira de governador quando o titular saiu para disputar eleições. Quem diria que, enquanto despachava papéis no Bandeirantes, ele já enxergava o gramado lá no fundo?
O apito que o lançou à CBF
Na Federação Paulista (1982-1988) ficou famoso pelo jeito incisivo — “como se todo jogo fosse final”, lembram colegas. Chefiou a delegação do Brasil na Copa de 1986 e, anos depois, virou vice-presidente da CBF. Em março / 2012, herdou o comando da entidade após a saída de Ricardo Teixeira. Entregou a Copa das Confederações 2013, inaugurou a nova sede na Barra da Tijuca em 2014 (batizada, num primeiro momento, com seu próprio nome). Durou até 2015, quando o escândalo da FIFA o puxou pelo paletó.
Medalha no bolso, câmera ligada 📸
Quem lembra da Copinha de 2012? Durante a premiação do Corinthians, Marin colocou uma medalha dos jogadores no bolso — o país inteiro viu ao vivo. Virou meme, virou símbolo de uma cartolagem que se achava acima do bom senso.
FBI na porta (e algemas na Suíça)
Em 27 de maio de 2015, autoridades suíças entraram no hotel onde dirigentes se hospedavam para o congresso da FIFA. Resultado: sete presos, entre eles Marin. A Justiça dos EUA o acusou de embolsar US$ 6,5 milhões em propinas ligadas a direitos de TV e marketing de torneios sul-americanos. Julgado no Brooklyn em 2017, foi condenado a quatro anos de prisão, multa de US$ 1,2 milhão e banido pela FIFA. Em 2020, já debilitado e em meio à pandemia, obteve liberação humanitária e voltou ao Brasil para cumprir prisão domiciliar.
Os últimos passos
Longe dos holofotes, viveu recluso na capital paulista. O AVC de 2023 acelerou a curva descendente da saúde. Amigos próximos contam que, mesmo fragilizado, mantinha ao lado da poltrona um radinho — queria saber como andavam Corinthians, São Paulo, Palmeiras…
O que fica?
Marin personifica uma era de portas fechadas, tapetes vermelhos e cifras nebulosas. Seu nome, que um dia brilhou na fachada de vidro da CBF, hoje soa mais nas páginas policiais do que nos almanaques de conquistas. A morte encerra um capítulo, mas o debate sobre transparência e ética no nosso futebol continua batendo à porta. Afinal, quantos outros medalhões ainda carregam nas lapelas medalhas que não lhes pertencem?