Os efeitos do Ebola do Sudão podem ir muito além da fase aguda da doença. Um estudo recente mostra que, para muita gente, a recuperação não acaba quando o vírus some do teste — e isso levanta questões importantes sobre cuidado e vigilância.
O estudo
Pesquisadores da Universidade Estadual de Washington acompanharam, em Uganda entre 2022 e 2023, 87 sobreviventes do surto de 2022–23 e compararam sua situação com a de pessoas da comunidade que não tiveram a infecção. Os achados, publicados na revista BMC Medicine, indicam impactos persistentes na saúde física, neurológica e reprodutiva — com implicações também para a vigilância e serviços de saúde em lugares como o Brasil, inclusive a Bahia.
Sequelas mais comuns
Os sintomas relatados com mais frequência foram:
- dores nas articulações e nas costas;
- perda de memória;
- dormência nas extremidades;
- problemas de visão;
- depressão.
Quase metade dos participantes disse ter múltiplas dificuldades que atrapalham tarefas do dia a dia — um quadro comparável ao que alguns chamam de “Ebola longo”, semelhante ao que observamos na COVID longa.
Persistência do vírus
Além das queixas clínicas, o estudo detectou traços do vírus em fluidos corporais por períodos prolongados: no sêmen por até 210 dias e no leite materno por até 199 dias após a recuperação. Em alguns casos, o vírus reapareceu meses depois de testes negativos, o que aumenta a preocupação sobre transmissão sexual e transmissão de mãe para filho.
Os autores explicam que esses fluidos são produzidos em áreas consideradas “imunoprivilegiadas”, onde o sistema imune responde de forma diferente — isso pode permitir que o vírus persista sem sinais clínicos óbvios e reforça a necessidade de monitoramento contínuo.
O que isso significa na prática?
Como acompanhar quem sobreviveu e que tipos de serviços de saúde são necessários? O estudo aponta para uma necessidade clara de atenção prolongada: serviços clínicos de longo prazo, suporte para sequelas físicas e mentais, e vigilância epidemiológica ampliada para detectar reaparições ou riscos de transmissão.
Essas medidas são importantes tanto nas áreas diretamente afetadas pelos surtos quanto em locais que podem receber pessoas infectadas — por exemplo, estados como a Bahia e outras regiões do Brasil.
Próximos passos
A equipe planeja ampliar o acompanhamento para quatro anos e incluir participantes de novos surtos, para entender melhor por quanto tempo o vírus pode permanecer no corpo e quais são os efeitos na saúde reprodutiva e geral das pessoas infectadas.
Em resumo: as marcas do Ebola podem ser duradouras. Saber disso ajuda a planejar cuidados mais sensíveis e de maior duração para quem sobreviveu — e a preparar melhor nossos serviços de saúde.