Com a maior faixa litorânea do Brasil, a Bahia possui grande parte de sua população e economia ligadas ao mar. Cerca de 53 municípios são banhados pelo Oceano Atlântico e sentem diretamente a influência deste ambiente. No último domingo, foi comemorado o Dia Mundial dos Oceanos, e as iniciativas para proteger a “Amazônia Azul” na Bahia têm crescido em diversas frentes.
Nesta reportagem, exploramos três projetos que combinam ativismo sócio-ambiental, pesquisa científica e a paixão pelos recifes baianos. O PRÓ-MAR e o Projeto Recifes de Pinaúnas (PRP) atuam na Baía de Todos-os-Santos, engajando comunidades como pescadores e marisqueiras. O projeto Coral Vivo, por sua vez, pesquisa corais em Abrolhos e Porto Seguro, a mais de 570 quilômetros de distância.
Inovação que vem do mar
Na Ilha de Itaparica, “Zé Pescador”, cujo nome é José Roberto Pinto, fundou a ONG PRÓ-MAR há 25 anos. Inicialmente, o trabalho era educar contra a pesca predatória. José fala que a iniciativa surgiu após uma filha o questionar sobre capturar lagostas ovadas.
Percebendo que outros pescadores agiam de forma similar, ele decidiu agir para alertá-los sobre os riscos à própria subsistência. Assim, foi criada a PRO-MAR. Com o tempo, a ONG expandiu suas ações para a preservação de corais.
O foco se tornou a educação ambiental, trabalhando com escolas e crianças. A organização se especializou na conservação de recifes de coral. Eles passaram a observar tudo que afeta esses ambientes, dentro e fora da água.
José fala que o grupo ajuda a fiscalizar desmatamento, assoreamento e descarte de tóxicos. Esse olhar levou a um novo desafio: controlar a espécie exótica invasora Coral Sol. Essa espécie, encontrada no Oceano Pacífico, apareceu em várias regiões do Brasil nos últimos 15 anos.
O trabalho de extração das espécies invasoras trouxe uma inovação inesperada. José conta que em 2020, durante a pandemia, ele começou a experimentar com os esqueletos dos corais retirados. Por serem feitos de carbonato de cálcio, a mesma composição dos corais nativos, surgiu uma ideia.
Eles criaram bloquinhos para servir de base para o cultivo de corais nativos. Fragmentos de corais nativos, como o coral de fogo, eram coletados e presos aos bloquinhos. O resultado foi muito satisfatório, chamando a atenção do professor Igor Cruz da UFBA.
Com apoio técnico, a curiosidade virou um projeto inédito na pesquisa marinha. José relata que a velocidade de desenvolvimento do coral nativo nos bloquinhos surpreendeu o professor. Isso motivou a busca por parceiros para expandir a iniciativa.
A parceria com a comunidade é fundamental, com voluntários contribuindo até hoje. A relação da população da ilha com o mar é histórica, segundo o pescador. Itaparica significa “cerca de pedra” em tupi-guarani, referindo-se aos recifes da costa leste.
Esse ambiente é vital para a pesca. José acredita que é preciso ainda mais engajamento dos pescadores nesse tipo de atividade. A Baía de Todos-os-Santos abriga mais de 3 milhões de baianos em 13 municípios, muitos dependendo de atividades marítimas.
José Roberto destaca a grande conectividade entre o Recife de Coral e o Manguezal. Ele explica que peixes muitas vezes nascem no recife, crescem na proteção das raízes dos mangues e depois retornam ao mar. É um ciclo essencial.
A revolução do manguezal
É neste ciclo que atua o Projeto Recifes de Pinaúnas (PRP), também na Ilha de Itaparica e Madre de Deus. A técnica em meio ambiente Deusdélia Andrade fala que o PRP começou com mobilização social voluntária. O objetivo era sensibilizar a comunidade sobre os impactos ambientais.
Ela conta que observou a poluição e as mudanças climáticas afetando os ecossistemas marinhos locais. Deusdélia escreveu um projeto de educação ambiental para trabalhar com os quatro principais ecossistemas costeiros da ilha. Um empreendimento financiou um piloto em uma escola municipal, permitindo adquirir equipamentos.
Com estrutura e público, o PRP leva educação ambiental para alunos de Vera Cruz e Madre de Deus. A proposta vai além da sala de aula, com aulas práticas no mangue. A principal atividade é o replantio de espécies nativas de manguezal.
Deusdélia fala que o replantio de manguezal é crucial para a saúde do planeta. Essas espécies protegem a costa contra erosões e servem de berçário marinho. Eles também capturam carbono, combatendo as mudanças climáticas.
Restaurar manguezais, segundo ela, é restaurar a vida e garantir segurança alimentar. Engajar a nova geração é vital para a governança ambiental. O projeto promove eventos e sensibilização para práticas sustentáveis.
Essa relação tem sido positiva, com mais envolvimento das comunidades locais. A ativista conclui que eles trabalham para preservar ecossistemas costeiros. O objetivo é promover um futuro sustentável entre humanidade e meio ambiente.
Porto dos Corais
A mais de 570 quilômetros da Baía de Todos os Santos, o projeto Coral Vivo se destaca em Porto Seguro. Sediado em Arraial D’Ajuda, é um centro de conhecimento científico sobre a vida dos corais. A pesquisadora Flávia Guebert falou sobre a importância da região.
O projeto, antes ligado à UFRJ, chegou à Bahia em uma expedição. Flávia conta que o Atlântico Sul, especialmente o Sul da Bahia, é um hotspot de biodiversidade marinha. Os pesquisadores vieram primeiro para Abrolhos estudar os corais.
Abrolhos tem logística complexa para viagens e estadia. Porto Seguro mostrou-se interessante pela diversidade de espécies e facilidade de acesso. A base do projeto se instalou em Arraial D’Ajuda por isso.
Flávia é uma das 35 pesquisadoras associadas à ONG. A pesquisa sempre foi o foco principal, reunindo muitos cientistas. Hoje, há uma grande rede de pesquisa com participação internacional.
O Coral Vivo agora vai além da pesquisa pura. Eles atuam em educação, conscientização e política pública. A oceanógrafa explica a evolução do projeto.
Flávia reforça que o avanço nos estudos ajuda a entender os corais como fonte vital de vida. Diversos organismos habitam os recifes. Eles encontram moradia, reprodução e alimento ali.
Os recifes de coral também protegem a costa de grandes ondas. Porto Seguro, por exemplo, tem um ambiente mais suave graças aos recifes. O trabalho do grupo acompanha as políticas ambientais mundiais.
A especialista fala que o Brasil tem reconhecido a riqueza da Amazônia Azul aos poucos. Apesar dos desafios, as políticas públicas têm aumentado. Ela cita a Década do Oceano da ONU como exemplo.
A Década do Oceano busca reverter o declínio da saúde dos oceanos até 2030. O movimento visa criar soluções baseadas na ciência. Flávia destaca que o Brasil é um país de mar e precisa valorizar e proteger sua cultura ligada ao oceano.
Há um movimento positivo para as pessoas conhecerem o mar, impulsionado pela Década do Oceano. Embora haja devastação, ela acredita que há muitas coisas positivas e fáceis de organizar.