Uma recente pesquisa internacional traz uma descoberta empolgante: o cometa 12P/Pons-Brooks, mais conhecido como “Cometa do Diabo”, pode ter pistas fundamentais sobre a origem da água na Terra. O estudo, divulgado na renomada revista científica Nature Astronomy, aponta fortes indícios de que a água encontrada no cometa é muito similar à do nosso planeta. Essa semelhança fortalece a teoria de que a abundante água terrestre, essencial para o desenvolvimento da vida, pode ter sido transportada para a Terra por meio de impactos de cometas. A descoberta tem um impacto significativo na compreensão da formação planetária e na busca por vida em outros corpos celestes, um tema de crescente interesse na comunidade científica, da Bahia ao Brasil.
A “Impressão Digital” da Água
Para desvendar esse mistério, a equipe de cientistas, liderada por Martin Cordiner, astrofísico molecular da NASA, utilizou observatórios de ponta: o Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA), no Chile, e o Infrared Telescope Facility (IRTF), da NASA, no Havaí. A investigação focou na proporção entre deutério e hidrogênio comum (D/H) na água do cometa – uma espécie de “impressão digital” molecular.
Essa “assinatura” única da água permite comparações precisas entre fontes cósmicas distintas. Os resultados foram surpreendentes: uma identidade quase completa entre a água do cometa 12P/Pons-Brooks e a água terrestre. Isso reforça a ideia de que, há bilhões de anos, a água do nosso planeta foi trazida por impactos de cometas, asteroides e meteoritos.
“Nossos novos resultados fornecem a evidência mais forte até agora de que pelo menos alguns cometas do tipo Halley carregavam água com a mesma assinatura isotópica encontrada na Terra, apoiando a ideia de que os cometas podem ter ajudado a tornar nosso planeta habitável.” disse Martin Cordiner, astrofísico molecular da NASA.
Cometa Criovulcânico e sua Importância
O 12P/Pons-Brooks é classificado como um cometa criovulcânico, um tipo fascinante que pertence à família dos cometas de Halley, com órbitas que variam entre 20 e 200 anos. Sua estrutura peculiar inclui uma camada gelada externa que envolve gás, poeira e gelo. Sua famosa cauda, formada pelo material expelido de seu interior, deu origem ao apelido “Cometa do Diabo” por assumir um formato singular de “chifre” durante suas erupções.
As medições detalhadas, realizadas com o ALMA, permitiram mapear a água do cometa com uma clareza sem precedentes. A equipe conseguiu distinguir a água comum (H₂O) da versão “pesada” (HDO), confirmando que ambas se originam diretamente do núcleo gelado do cometa, e não de processos químicos secundários na coma (a nuvem de gás e poeira que o envolve).
“Ao mapear H₂O e HDO na coma do cometa, conseguimos identificar se os gases vêm realmente do gelo do núcleo, o que nos dá mais confiança nas medições.” explicou Stefanie Milam, cientista da NASA e coautora do estudo.
Este achado é crucial. Afinal, observações anteriores de cometas similares mostravam valores de D/H distintos, o que enfraquecia a teoria de que cometas seriam os principais transportadores de água para a Terra. Com essa nova evidência, a hipótese de que esses corpos celestes foram essenciais para a formação dos oceanos e rios do nosso planeta ganha um reforço considerável.
Implicações para a Busca por Vida
Os resultados dessa pesquisa consolidam uma visão cada vez mais aceita: cometas tiveram um papel essencial na criação de um ambiente propício à vida na Terra primitiva. Não apenas pela água, mas porque esses objetos são capazes de carregar também compostos orgânicos – as moléculas fundamentais para o surgimento da vida.
Embora a origem exata da água terrestre ainda seja um tema de intensa investigação, a análise do “Cometa do Diabo” representa uma das evidências mais robustas obtidas até o momento. Para os cientistas, é um avanço significativo para entender como nosso planeta se tornou habitável e, por extensão, para avaliar a possibilidade de que outros mundos distantes também possam abrigar vida. O cometa, que atingiu o ponto mais próximo do Sol em abril do ano passado, só nos fará uma nova visita em 2095.