Há décadas os betabloqueadores são usados após um infarto como tratamento padrão. Mas e se esse remédio não for tão útil para todo mundo?
O que o estudo mostrou
Um estudo internacional publicado no European Heart Journal concluiu que os betabloqueadores, empregados há mais de 40 anos, não trouxeram benefício claro para a maioria dos pacientes depois do infarto. Em mulheres com função cardíaca preservada — fração de ejeção acima de 50% — o uso chegou a aumentar o risco de novos eventos.
Segundo os autores, mulheres desse grupo tiveram risco significativamente maior de sofrer novo infarto, serem hospitalizadas por insuficiência cardíaca ou morrer quando tratadas com betabloqueadores; o risco foi quase três vezes maior em comparação às que não receberam o medicamento.
“Essas descobertas reformularão todas as diretrizes clínicas internacionais e devem desencadear uma abordagem específica para cada sexo no tratamento das doenças cardiovasculares”, disse o Dr. Valentin Fuster, do Hospital Mount Sinai, em Nova York.
O ensaio clínico REBOOT, que acompanhou mais de 8.500 pacientes na Espanha e na Itália, reforçou que não houve benefício no uso rotineiro de betabloqueadores em homens ou mulheres com fração de ejeção preservada. Os pesquisadores apontaram que avanços como o uso precoce de stents e de anticoagulantes após o infarto reduziram a necessidade desse tipo de medicação.
- Uso atual: os betabloqueadores eram aplicados em cerca de 80% dos pacientes após infarto.
- Exceção: pessoas com fração de ejeção entre 40% e 50% continuam a apresentar benefício, com redução de 25% dos riscos de novos eventos (análise publicada no The Lancet).
- Risco em mulheres: aumento de eventos observado especialmente em quem recebeu doses elevadas do betabloqueador.
Especialistas explicam que homens e mulheres respondem de forma distinta aos medicamentos cardiovasculares por fatores como tamanho do coração, sensibilidade a fármacos para pressão arterial e características próprias da doença cardíaca feminina. O Dr. Borja Ibáñez, do Centro Nacional de Investigação Cardiovascular de Madri, destacou que o efeito adverso foi mais evidente em mulheres com doses elevadas.
“O gênero tem muito a ver com a forma como as pessoas respondem à medicação”, disse o Dr. Andrew Freeman, do National Jewish Health, em Denver.
Os autores e especialistas recomendam revisão das práticas clínicas e das diretrizes, defendendo abordagens terapêuticas diferenciadas por sexo. Em suma: é hora de tratamentos mais personalizados, não regras únicas para todos.