Uma banda de rock psicodélico, conhecida como The Velvet Sundown, está no centro das discussões da indústria musical após a confirmação de que se trata de uma criação inteiramente gerada por inteligência artificial. O grupo, que já acumula mais de 1 milhão de ouvintes mensais no Spotify, destaca o avanço da tecnologia no setor e reacende o debate sobre autoria e a natureza da arte.
O projeto sintético, que contou com direção criativa humana, demonstrou um potencial financeiro significativo, gerando mais de US$ 34 mil em um único mês por meio das plataformas de streaming. A iniciativa é descrita em seu perfil no Spotify como uma “provocação artística” que visa explorar conceitos de identidade e o futuro da produção musical.
Impacto no Mercado e Reações Divergentes
Apesar do sucesso comercial, a ascensão de The Velvet Sundown tem gerado reações mistas. Profissionais da indústria musical, em entrevistas à CNBC, descreveram a música gerada por IA com termos como “sem alma” e “assustador”, vendo-a como uma ameaça aos artistas humanos. Esse sentimento reflete uma preocupação crescente com a desumanização da arte e a potencial exploração comercial sem limites, conforme apontam especialistas.
O fenômeno não é isolado. Ferramentas de IA como Suno e Udio, que possibilitam a criação de músicas completas a partir de simples comandos, têm facilitado o surgimento de diversos artistas virtuais. Casos como o do músico “dark country” Aventhis, que também possui centenas de milhares de ouvintes mensais, ilustram a expansão dessa tendência. Dados da Deezer, serviço de streaming francês, indicam que 18% das faixas enviadas à plataforma já são integralmente geradas por inteligência artificial.
Custo Reduzido e Ameaças a Independentes
Uma das razões para a proliferação dessas produções é o baixo custo envolvido. Plataformas como Suno e Udio oferecem planos gratuitos e opções premium por menos de US$ 30 mensais, incentivando a produção em larga escala. Para o professor Jason Palamara, da Universidade de Indiana, a evolução é notável:
“Estamos além dos loops repetitivos. Agora, a IA entrega músicas estruturadas com versos e refrões que fazem sentido.”
Palamara acredita que projetos como The Velvet Sundown representam apenas “a ponta do iceberg” do que está por vir. No entanto, essa lógica de volume, aliada aos algoritmos de recomendação, complica a realidade de artistas independentes, que enfrentam maior dificuldade para alcançar visibilidade e rentabilidade.
A cantora britânica Tilly Louise, de 25 anos, expressou seu desânimo:
“É desanimador ver uma ‘banda’ que nem existe viralizar nas redes enquanto artistas reais mal conseguem pagar as contas.”
Respostas da Indústria e Desafios Éticos
Diante desse cenário, a indústria musical tenta se adaptar. Escolas e universidades, por exemplo, começaram a integrar a IA em seus currículos, ensinando os alunos a utilizá-la como ferramenta criativa. Nomes de peso, como Timbaland, também exploram a tecnologia, com o lançamento do projeto Stage Zero, que contará com uma estrela pop gerada por inteligência artificial.
Contudo, a resistência também é forte. Grandes gravadoras, incluindo Sony Music, Universal e Warner, já movem processos contra plataformas de IA por supostas violações de direitos autorais. Milhares de músicos, por sua vez, defendem que o uso de obras humanas no treinamento de inteligência artificial deve ocorrer somente com consentimento.
Anthony Fantano, comentarista musical conhecido no YouTube, alerta para os riscos culturais da inteligência artificial na arte:
“A arte com IA não oferece nada que os humanos já não possam fazer melhor. É uma forma de eliminar artistas reais em nome do lucro.”
Entidades como a Federação Americana de Músicos reforçam a necessidade de transparência. O presidente Tino Gagliardi enfatiza:
“Consentimento, crédito e compensação são fundamentais. Qualquer coisa abaixo disso é roubo.”
Enquanto o avanço da música gerada por inteligência artificial prossegue e a regulamentação ainda se mostra incipiente, o setor musical ingressa em uma nova era, cujos contornos e implicações ainda estão em definição.