Documentos internos obtidos pelo The New York Times mostram que a Amazon planejou automatizar até 75% de suas operações nos Estados Unidos, uma mudança que poderia eliminar mais de 600 mil empregos até 2033. É uma meta tão ambiciosa que levanta perguntas óbvias sobre quem ganha e quem perde com esse movimento.
O plano em poucas linhas
Em linguagem prática, os registros descrevem metas e estimativas claras:
- Evitar a contratação de cerca de 160 mil trabalhadores até 2027, com uma economia estimada de cerca de US$ 0,30 por item processado.
- Replicar o modelo de automação em cerca de 40 centros de distribuição.
- Dobrar o número de produtos comercializados até 2033, sem aumento proporcional do quadro de funcionários.
O documento cita como referência o centro de Shreveport, na Louisiana, descrito como o mais avançado da empresa: ali, aproximadamente 1.000 robôs já cuidam de grande parte da embalagem e do envio, permitindo operar com cerca de 25% menos trabalhadores que um centro tradicional. A expectativa interna era que naquele galpão a automação reduzisse pela metade os postos de trabalho até 2026.
Como a empresa falava sobre isso por dentro
Os registros mostram preocupação com a linguagem usada em comunicação interna. Equipes sugeriram evitar termos como robô, automação e inteligência artificial, preferindo expressões como tecnologia avançada ou cobots (robôs colaborativos). Também houve discussões sobre como controlar a narrativa em regiões onde empregos poderiam ser reduzidos, destacando vagas técnicas e de manutenção.
Impacto no mercado de trabalho
Os documentos e estudos citados na cobertura apontam efeitos amplos: a Amazon é hoje o terceiro maior empregador dos EUA, com cerca de 1,5 milhão de funcionários. Pesquisas mencionadas indicam que a adição de um robô a cada 1.000 trabalhadores poderia reduzir salários em cerca de 0,42% e contribuir para a eliminação de milhares de vagas.
Especialistas alertam que a automação em larga escala tende a atingir primeiro trabalhadores de menor renda e a população negra, que é maioria nas funções de armazém. Como disse o economista Daron Acemoglu, do MIT, se os planos se confirmarem a empresa poderia deixar de ser ‘um criador líquido de empregos’ e se tornar ‘um destruidor líquido de empregos’.
Resposta da Amazon
Em sua resposta às reportagens, a Amazon afirmou que os documentos vazados ‘não representam o plano de contratação global da empresa’ e refletem apenas a visão de uma equipe interna. A companhia também informou que planejava contratar 250 mil pessoas para o período de fim de ano, sem detalhar quantas dessas vagas seriam permanentes.
Consequências e prazos
Analistas ouvidos pela imprensa viram nos detalhes um alerta para governos e empresas: haverá necessidade de políticas de qualificação e regulação caso a automação avance nesse ritmo. No Brasil, observadores apontaram que impactos semelhantes em empresas globais poderiam repercutir em estados com forte presença logística, como a Bahia, reforçando a discussão sobre preparo da mão de obra para funções técnicas.
Os prazos destacados nos documentos são claros: redução de contratações prevista até 2027, cortes contínuos em instalações como a de Shreveport até 2026 e um horizonte de expansão da automação e do portfólio de produtos até 2033.
No fim das contas, ficam perguntas difíceis: como preparar trabalhadores, comunidades e políticas públicas para essas mudanças? O debate sobre qualificação e regulação parece inevitável.