Na semana passada, o governo federal começou a exonerar ocupantes de cargos comissionados e funções de direção em ministérios e estatais. Segundo atos publicados no Diário Oficial da União, as demissões foram adotadas na esteira da derrota na votação da medida provisória 1303/2025.
Alvos imediatos
Quem foi atingido? Entre as primeiras dispensas publicadas estavam:
- Quatro superintendências no Ministério da Agricultura;
- Uma diretoria no Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit);
- Três regionais da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf);
- Uma superintendência do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan);
- Uma vice-presidência da Caixa Econômica Federal (CEF).
Alguns casos chamaram atenção pela ligação direta com parlamentares: o engenheiro eletricista Harley Xavier Nascimento foi exonerado no dia 10 da superintendência regional da Codevasf em Bom Jesus da Lapa (BA). Harley havia sido indicado pelo deputado Arthur Maia (União Brasil), que votou contra a orientação do governo; o parlamentar publicou vídeo elogiando o servidor, que ocupava o cargo havia nove anos. Também foi demitida Lena Carolina Brandão, da superintendência do Iphan no Maranhão, irmã do líder do União Brasil na Câmara, Pedro Lucas (União-MA).
Houve ainda exonerações de nomes ligados ao senador Ciro Nogueira (PP) e de representantes do PL na Caixa: o consultor José Trabulo Junior e o vice-presidente Paulo Rodrigo de Lemos Lopes, respectivamente. Segundo o Executivo, as primeiras medidas vieram após identificar a participação do presidente do PP, Ciro Nogueira, e do presidente do PSD, Gilberto Kassab, na articulação que levou à derrota na votação que pretendia tributar aplicações financeiras.
Na Codevasf, a presidência da empresa ficou entre os cargos mais ameaçados. O atual diretor-presidente, Lucas Felipe de Oliveira, foi indicado pelo deputado Elmar Nascimento (União Brasil). A direção da companhia — que tinha orçamento superior a R$ 2 bilhões — já passou por controvérsias: o engenheiro Marcelo Moreira, que chegou a chefiar a gestão anterior, acumulou denúncias de irregularidades e uso de recursos vinculados a emendas de relator.
Parlamentares e alcance
Doze deputados da bancada da Bahia que votaram pela retirada de pauta da MP 1303/2025 — o que levou ao arquivamento da medida — passaram a figurar entre aqueles cujas indicações podem ser alvo de cortes. Além de Elmar Nascimento e Arthur Maia, votaram pela retirada de pauta os deputados:
- Adolfo Viana (PSDB)
- Alex Santana (Republicanos)
- Capitão Alden (PL)
- Claudio Cajado (PP)
- Dal Barreto (União)
- José Rocha (União)
- Leur Lomanto Jr. (União)
- Márcio Marinho (Republicanos)
- Paulo Azi (União)
- Rogéria Santos (Republicanos)
Um levantamento do site Uol, citado pelo governo como referência para mapear as indicações, apontou que cerca de 380 filiados a partidos do Centrão ocupavam cargos comissionados ou de natureza especial antes da série de exonerações. A distribuição por partido incluía, entre outros:
- União Brasil – 119 cargos (presença em pastas como Integração Regional, Presidência, AGU, Transportes e Povos Indígenas)
- MDB – 112 cargos (Transportes, Saúde, Gestão e Inovação, Minas e Energia, Presidência)
- PSD – 63 cargos (Agricultura, Pesca, Saúde, Integração, Povos Indígenas)
- PP – 48 cargos (Esporte, AGU, Saúde, Integração, Gestão e Inovação)
- Republicanos – 36 cargos (Integração, Povos Indígenas, Transportes, Portos e Aeroportos, Agricultura)
O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT), afirmou que outras demissões poderiam ocorrer ainda durante a semana e atribuiu à ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, a iniciativa de fazer um pente-fino nos cargos ligados a parlamentares. Guimarães relatou um diálogo em que o presidente teria pedido ação rápida.
“Eu acho que vai ter um rebuliço do tamanho do mundo. Qual é o rebuliço? A Gleisi vai meter a faca. Eu estava na reunião com ela e o Lula. O Lula disse: ‘Gleisi, você agilize, viu, e mexa no vespeiro aí da Caixa Econômica para começar’. E, evidentemente, eles estão apavorados”, disse o líder do governo.
As exonerações já publicadas no Diário Oficial serviram como ponto de partida para o mapeamento interno das ligações políticas entre ocupantes de cargos e seus padrinhos parlamentares — um processo que, segundo o governo, deve revelar indicações cruzadas e outras conexões que ainda estão sendo identificadas.