É com um nó na garganta que olhamos para os números da Bahia: nosso estado, infelizmente, se destaca no cenário nacional por um dado extremamente doloroso. No último ano, um número alarmante de crimes sexuais contra crianças e adolescentes foi registrado, colocando a Bahia entre os mais afetados do país.
Um Cenário de Alerta: Os Números na Bahia
Dados do Anuário de Segurança Pública revelam uma realidade dura: a Bahia é o terceiro estado com mais casos de exploração sexual infantojuvenil, registrando 80 ocorrências. Além disso, somos o quarto em pornografia infantil, com 180 registros. Mas, o que significam esses termos e a gravidade por trás deles?
A exploração sexual infantojuvenil, que o Código Penal e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) definem como o uso de menores para fins sexuais em troca de lucro – como prostituição, pornografia, tráfico e turismo sexual – teve 1.058 registros em todo o Brasil no último ano. Na Bahia, com seus 80 casos envolvendo crianças e adolescentes de 0 a 17 anos, ficamos atrás apenas de São Paulo (165) e Pará (103). É de partir o coração saber que as principais vítimas em nosso estado tinham entre 10 e 13 anos (21 casos) e 14 e 17 anos (50 casos).
O aliciamento de crianças, que é quando alguém “alicia, assedia, instiga ou constrange, por qualquer meio de comunicação, criança, com o fim de com ela praticar ato libidinoso” (artigo 241 do ECA), registrou 1.857 ocorrências no país. Na Bahia, foram 12 casos, afetando crianças de 5 a 9 anos (4 casos) e de 10 a 13 anos (8 casos). Uma realidade que nos faz refletir sobre a segurança de nossas crianças até mesmo no ambiente digital.
Já a produção e distribuição de pornografia infantil – um crime que o ECA descreve como a “produção, reprodução, direção, fotografia, filmagem ou registro, por qualquer meio, de cena de sexo explícito ou pornográfica, envolvendo crianças ou adolescentes” – foi a violação com o maior volume de registros: 3.158 casos em todo o Brasil. A Bahia aparece em quarto lugar, com 180 ocorrências, superada por São Paulo (861), Paraná (271), Santa Catarina (216) e Minas Gerais (206). As idades mais afetadas? Mais uma vez, crianças e adolescentes de 10 a 13 anos (68 casos) e de 14 a 17 anos (85 casos).
Onde Acontece o Inimaginável?
Embora os dados de estupro e estupro de vulneráveis por estado não tenham sido detalhados, o panorama nacional é estarrecedor: 69,1% desses crimes acontecem dentro de casa, com o agressor geralmente sendo alguém da família. A via pública responde por 10,5% e áreas rurais por 3%. Ou seja, em muitos casos, o perigo está onde menos se espera, e por quem menos se desconfia.
O relatório aponta que 63% dos agressores são familiares das vítimas, enquanto 29% são conhecidos sem laços de parentesco e apenas 8% são desconhecidos. Esses números nos alertam para a importância de estar atento aos sinais, mesmo dentro do círculo mais íntimo. Crimes contra jovens acima de 14 anos foram mais comuns aos domingos, enquanto os estupros de vulneráveis (até 13 anos) ocorreram majoritariamente às segundas-feiras. É chocante pensar que 61% das vítimas de estupro de vulnerável tinham até 13 anos, e que meninos foram maioria nas faixas etárias principais, especialmente aos 13 anos, e meninas nos 12 e nos 5 anos de idade.
A Força da Defensoria Pública em Ação
Diante dessa realidade tão delicada, a Defensoria Pública Especializada de Salvador, através de sua coordenadora Laissa Rocha, atua em várias frentes. Ela explica o rigor das investigações:
“Qualquer tipo de violação, seja estupro ou outros tipos de violência sexual contra crianças e adolescentes, é um crime. Então, como crime, ele vai ser devidamente apurado em um inquérito policial. Durante as investigações vão se coletar ali os elementos de prova e ao final do inquérito, ele vai ser encaminhado para o Ministério Público, que pode oferecer uma denúncia ou não. O Ministério Público vai verificar se tem elementos suficientes para ajuizar uma ação criminal contra a pessoa autora do fato, ou se vai requerer o arquivamento.”
A atuação da Defensoria não se limita à esfera criminal; ela se estende à prevenção e ao apoio cível. Laissa Rocha destacou as importantes ações preventivas:
“A Defensoria Pública atua tanto com a prevenção, quanto elucidando para aquela criança que ela está sendo vítima de violência sexual, para que ela consiga sair daquele ciclo de violência, pedir ajuda. Então, a defensoria pública, ela fomenta campanhas de combate, enfrentamento à violência sexual,” afirmou a coordenadora.
No campo cível, a Defensoria lida frequentemente com casos onde os agressores são pais ou padrastos, muitas vezes com a triste conivência da mãe. Esses casos chegam por meio de outros familiares ou do Conselho Tutelar, mostrando a importância da rede de apoio.
Trabalhando lado a lado com a Delegacia Especializada de Repressão a Crimes Contra a Criança e o Adolescente (DERCA), a Defensoria Pública busca ações como a destituição do poder familiar do agressor e o pedido de guarda para outros parentes, garantindo a segurança e o bem-estar da criança. A coordenadora Laissa Rocha enfatiza que o combate a esses crimes é um esforço coletivo:
“As instituições, de modo geral, tanto as instituições do Sistema de Justiça, quanto os órgãos públicos, organizações não governamentais trabalham e discutem muito a temática, de maneira coletivizada. Então a gente costuma participar de muitos eventos, de muitas ações organizadas pelo município, organizadas pelo estado, muito com foco de visibilizar a pauta e esclarecer a população sobre o tema,” concluiu.
Essa união de esforços é crucial para combater um problema que afeta profundamente o futuro de nossas crianças e adolescentes. É um chamado à atenção e à responsabilidade de todos para proteger os mais vulneráveis em nossa sociedade.