Noite para esquecer no Morumbis. Pela 19ª rodada do Brasileirão, o Vitória caiu por 2×0 para o São Paulo e saiu de campo com uma sensação incômoda: o fantasma do rebaixamento não é mais figura distante. Com nove desfalques e uma sequência de improvisos que escancarou as fragilidades do elenco, o time de Fábio Carille viu ruir a série de cinco partidas sem perder — e a dúvida ficou no ar: dá para reagir?
Os gols de Bobadilla, aos 20 do primeiro tempo, e de Sabino, já aos 40 da etapa final, contam mais do que um placar. Eles mostram um Vitória desorganizado, remendado e perigosamente próximo de uma zona de rebaixamento que, a cada rodada, parece mais real.
Elenco curto, improvisos e pouca margem de erro
A partida expôs de forma cruel o tamanho das limitações rubro-negras. Sem nove peças, Carille precisou recorrer ao “jeitinho” tático — e pagou o preço. Edu, zagueiro, virou lateral-direito porque Claudinho e Raúl Cáceres estavam fora (lesão e suspensão). Quebrou um galho? Em partes. O lado defensivo perdeu equilíbrio e ficou vulnerável à organização tricolor.
Do outro lado, Ramon estreou. Emprestado pelo Internacional e regularizado na véspera, o lateral-esquerdo de 24 anos ainda busca ritmo e entrosamento — normal para quem entra num cenário tão adverso.
No meio, as ausências também pesaram. Pepê cumpriu suspensão do STJD, enquanto Matheuzinho e Willian Oliveira seguem no DM. Resultado: Lucas Braga, atacante de origem, teve de recuar para funções que não são as suas. Outro remendo que não resolveu.
São Paulo controla, Vitória pouco cria
Com o adversário bem postado e praticamente completo, o Vitória penou para levar perigo. O São Paulo, comandado por Hernán Crespo, ditou o ritmo desde o início e foi superior técnica e taticamente.
O 1×0 nasceu de jogada bem trabalhada pela direita: Rodriguinho foi ao fundo e cruzou rasteiro para Bobadilla finalizar de primeira aos 20. O lance expôs, de novo, a dificuldade rubro-negra em acompanhar as trocas e infiltrações.
Faltou criatividade na frente — e fez falta Erick, que pertence ao São Paulo e não pôde atuar por questão contratual. Sem ele, o Vitória voltou a insistir nas bolas aéreas, um recurso que vira vício quando a construção não acontece.
No segundo tempo, Carille mexeu para mudar o roteiro, mas o São Paulo manteve o controle. O 2×0 saiu num escanteio cobrado por Ferraresi, com Sabino livre para testar às redes aos 40.
Sequência invicta quebrada na hora errada
Doeu. A derrota encerra a série de cinco jogos sem perder que vinha alimentando esperança no Barradão. Carille, anunciado em 9 de julho para conter a queda, somava uma vitória e quatro empates em seis jogos antes do Morumbis — invencibilidade que soava mais como “sobrevida” do que como virada de chave, especialmente pelos 2×2 contra Sport e Palmeiras no Barradão.
Quebrar a série num momento tão sensível só amplia a apreensão. Com 18 pontos em 19 partidas, o Vitória está entre as campanhas mais fracas da turma que luta para ficar.
Tabela liga o alerta
A fotografia do campeonato não ajuda. Com 18 pontos, o Vitória é 16º — apenas três acima do Vasco, primeiro dentro do Z-4, que tem duas partidas a menos. Ou seja: a margem é mínima.
As projeções do Departamento de Matemática da UFMG reforçam o sinal amarelo: times com desempenho similar neste ponto da competição costumam correr risco alto de queda. O aproveitamento atual, de 31,6%, coloca o Leão no grupo dos candidatos. E a conta é simples: a “nota de corte” para permanecer costuma ficar entre 43 e 45 pontos. Traduzindo: será preciso, no mínimo, dobrar a pontuação nos 19 jogos restantes.
Carille sob pressão — e com poucos recursos
A atuação no Morumbis deixa Carille em terreno delicado. O aproveitamento sob seu comando é de 38,8%, melhor que os 30,5% de Thiago Carpini, mas ainda insuficiente para tirar o time do sufoco. As soluções emergenciais viraram rotina, e isso diz tanto sobre a escassez do elenco quanto sobre a dificuldade de encontrar alternativas efetivas.
A defesa segue vulnerável, sobretudo pelo alto: 70% dos gols sofridos na temporada nasceram em bolas aéreas. Isso não é detalhe — é ferida aberta.
Agora, o técnico precisa mexer no que dá para mexer: recuperar a confiança do grupo, ajustar o que for possível sem trocar peças e transformar suor em pontos. Fácil? Nem um pouco. Necessário? Totalmente.
O que vem pela frente
O calendário não espera. Sábado (16), às 18h30, tem duelo direto com o Juventude no Barradão — jogo de seis pontos, daqueles que mudam humor e tabela. Em casa, com a torcida por perto, é a chance de virar a chave. Mas ela passa por uma condição básica: reduzir a lista de ausências para que os improvisos deixem de pautar o time.
Nos bastidores, a diretoria corre atrás de reforços dentro de um cenário financeiro curto. A chegada de Ramon é um passo, não a solução. Ainda há muito a cobrir.
Um gigante em xeque — e ainda com tempo para reagir
A derrota por 2×0 não foi um ponto fora da curva: foi um retrato das limitações atuais. Elenco reduzido, improvisos constantes e proximidade perigosa com o Z-4 formam um coquetel explosivo. O roteiro assusta, mas não está fechado.
Carille, jogadores e direção têm nas mãos as próximas páginas. O torcedor rubro-negro, fiel como poucos, espera sinais de reação já na próxima semana. Vai ser no sofrimento? Provavelmente. Mas, se o Vitória transformar cada rodada em decisão — e corrigir o que se repete há meses — ainda dá para reescrever essa história antes do apito final.