O número de mortos no conflito que atinge a Faixa de Gaza há cerca de 22 meses alcançou 60.034 nesta terça-feira (29), conforme dados divulgados pelo Ministério da Saúde do território palestino, controlado pelo Hamas. Além das fatalidades, o órgão registrou 145.870 feridos em decorrência dos confrontos.
A pasta, que compila as estatísticas sem distinguir entre combatentes e civis, estima que aproximadamente 30% das vítimas sejam crianças e 16% mulheres. Apesar de a Organização das Nações Unidas (ONU) utilizar esses números em seus relatórios, a verificação independente por parte da imprensa internacional é frequentemente impedida pelo bloqueio imposto por Israel na região.
Crise Humanitária e Fome Aguda
O recente aumento no número de mortos ocorre em um contexto de severa crise humanitária, com um disparo nas mortes relacionadas à fome, resultado das restrições à entrada de ajuda. No último domingo (27), a Organização Mundial da Saúde (OMS) revelou que, das 74 mortes ligadas à desnutrição registradas em 2025, 63 ocorreram somente em julho, incluindo 24 crianças com menos de cinco anos.
Nesta terça, a Classificação Integrada de Fases de Segurança Alimentar (IPC), iniciativa com suporte da ONU, declarou que Gaza enfrenta o “pior cenário possível de fome”. A entidade apontou que “evidências crescentes mostram que a insegurança alimentar generalizada, a desnutrição e as doenças estão provocando um aumento nas mortes relacionadas à falta de alimentos”. Relatório da organização indica que “uma em cada três pessoas passa vários dias sem comer nada”, e mais de 20 mil crianças foram tratadas por desnutrição aguda entre abril e meados de julho, com mais de 3 mil casos severos.
“Declarações formais de fome sempre ficam atrás da realidade. Na época em que a fome foi declarada na Somália, em 2011, 250 mil pessoas — metade delas crianças menores de 5 anos — já haviam morrido. Quando a fome for declarada, já será tarde demais.”
A afirmação de David Miliband, chefe do Comitê Internacional de Resgate (IRC), ressalta a gravidade da situação. Os critérios da IPC para considerar um território em fase crítica de fome incluem:
- Pelo menos 20% dos moradores em escassez extrema de alimentos.
- Uma em cada três crianças com desnutrição aguda.
- Mortes por desnutrição e doenças atingindo duas pessoas a cada 10 mil.
Os dados mais recentes indicam que esses limiares formais já foram ultrapassados na maior parte de Gaza.
Desafios na Ajuda Humanitária
Para a população de mais de 2 milhões de habitantes, o IPC calcula uma necessidade mensal de 62 mil toneladas de alimentos básicos. No entanto, a agência israelense de coordenação de ajuda, Cogat, informou que apenas 19.900 toneladas entraram em maio e 37.800 em junho. Israel concordou em implementar pausas humanitárias diárias nos bombardeios em três áreas de Gaza para permitir a entrada de auxílio, após imagens de crianças desnutridas repercutirem globalmente. Antes disso, a ajuda havia sido bloqueada completamente por 11 semanas a partir de março.
Organizações atuantes na região avaliam que as medidas recentes ainda são insuficientes. Ross Smith, do Programa Mundial de Alimentos (PMA) da ONU, declarou que estão recebendo “aproximadamente 50% do que solicitamos para Gaza” desde o início das pausas humanitárias. Ele também salientou a falta de estoques e permissões para reabrir padarias e cozinhas comunitárias que funcionavam antes do bloqueio total.
Smith comparou a situação às crises humanitárias do século XX na Etiópia e Biafra, na Nigéria, afirmando que “isso não se parece com nada que tenhamos visto neste século”. O PMA estima que cerca de 470 mil pessoas enfrentam condições de fome, e 90 mil mulheres e crianças necessitam de nutrição especializada.
Controvérsias na Distribuição de Alimentos
Após o bloqueio no primeiro semestre, apenas operações de ajuda limitadas, lideradas pela ONU, foram retomadas. Grande parte dos mantimentos passou a ser distribuída pela Fundação Humanitária de Gaza (FHG), uma nova entidade com sede nos Estados Unidos e apoiada por Israel. Na semana passada, a ONU acusou o Exército israelense de ter causado a morte de mais de 1.000 pessoas que tentavam obter ajuda em Gaza desde então, a maioria próxima às instalações da fundação.
O IPC aponta que a maioria dos itens alimentares distribuídos pela FHG “requer água e combustível para cozinhar, que estão amplamente indisponíveis”. A organização afirmou que sua “análise dos pacotes de alimentos fornecidos pela FHG mostra que seu plano de distribuição levaria à fome em massa”. Em contrapartida, Gideon Saar, Ministro das Relações Exteriores de Israel, disse nesta terça que, embora a situação em Gaza seja difícil, há “mentiras”. Ele mencionou que 5.000 caminhões de ajuda entraram no território nos últimos dois meses e que Israel está à disposição para apoiar lançamentos aéreos, método que, segundo grupos de ajuda, é ineficaz e meramente simbólico.