Um homem de 39 anos, natural de Caruaru (PE), foi preso no último sábado (26), em Boituva, no interior de São Paulo, suspeito de aplicar o chamado “golpe do amor” — ou estelionato sentimental — em mulheres de pelo menos cinco estados do país. A prisão aconteceu após uma operação conduzida pela Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (DEAM) de Feira de Santana, que investigava crimes contra uma servidora pública da cidade baiana.
No momento da prisão, ele vivia com uma nova vítima — um padrão recorrente, segundo apontam as investigações. A operação contou com o apoio da Força Integrada de Combate ao Crime Organizado de São Paulo (FICCO/SP) e do setor de inteligência da Polícia Civil do interior baiano (1ª Coorpin).
Como funcionava o golpe
Em Feira de Santana, o suspeito abordou a vítima pelas redes sociais, apresentando-se como um empresário de sucesso. Em pouco tempo, já fazia juras de amor, promessas de casamento e até de abrir um negócio juntos. Ganhando a confiança da mulher, passou alguns dias em sua casa e, nesse período, a convenceu a fazer transferências via PIX e usar o cartão de crédito em seu nome.
A justificativa? Que o dinheiro seria usado em um empreendimento promissor que traria lucro para os dois. Mas, assim que recebeu os valores, ele simplesmente cortou o contato e desapareceu.
“O investigado se aproveitava da fragilidade emocional das vítimas para criar relacionamentos falsos e, com isso, obter ganhos financeiros”, explicou a delegada Lorena Almeida, titular da DEAM de Feira.
O golpe se espalhava por vários estados
E esse não foi um caso isolado. As investigações mostram que o homem atuava de forma itinerante e já havia feito vítimas na Bahia, Sergipe, Pernambuco, São Paulo e Rio Grande do Norte. Até o momento, 13 mulheres foram identificadas como vítimas, e ele responde a pelo menos 10 inquéritos em diferentes estados.
Em Aracaju (SE), por exemplo, ele aparece em sete boletins de ocorrência. Em um dos casos mais graves, causou prejuízo de R$ 130 mil — e ainda utilizou de coação e extorsão.
A tática dele envolvia perfis falsos nas redes sociais, uso de várias contas bancárias e forte manipulação emocional. O homem oferecia empregos fictícios, especialmente no setor farmacêutico, e até usava argumentos religiosos para conquistar a confiança de mulheres evangélicas.
Estelionato sentimental: um golpe cada vez mais comum
Esse tipo de crime tem crescido bastante no Brasil. Segundo a iniciativa “Era golpe, não amor”, quatro em cada dez mulheres já foram vítimas desse tipo de fraude emocional. A armadilha costuma atingir principalmente mulheres brancas, de 25 a 44 anos, moradoras de bairros de classe média-alta e com renda acima de três salários mínimos. Profissionais da saúde, como enfermeiras e psicólogas, são particularmente afetadas — talvez pela carga emocional de suas rotinas.
A estratégia dos golpistas é sutil, mas eficiente: começam com uma enxurrada de elogios e declarações de amor — o chamado love bombing — e, depois, criam situações dramáticas para justificar pedidos de dinheiro. Eles se aproveitam de tudo que a vítima posta nas redes para montar uma persona irresistível.
O impacto vai além do bolso
As consequências desse tipo de golpe não são só financeiras. Muitas vítimas enfrentam traumas profundos, como depressão, crises de ansiedade e perda de autoestima. E, por sentirem vergonha ou medo de julgamento, nem sempre procuram ajuda.
A professora Núbia Araújo, de Teixeira de Freitas, por exemplo, perdeu R$ 240 mil para um golpista com o mesmo perfil. O abalo foi tão grande que ela precisou se afastar do trabalho e, até hoje, tem crises de ansiedade só de olhar o extrato bancário.
O que diz a lei?
O estelionato sentimental se enquadra no artigo 171 do Código Penal, com pena de 1 a 5 anos de prisão e multa. Quando ocorre no contexto de uma relação íntima, a Lei Maria da Penha também pode ser aplicada, por se tratar de violência patrimonial.
Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu que esse tipo de golpe dá direito a indenização por danos morais e materiais — uma vitória importante para as vítimas.
Além disso, está em tramitação na Câmara o Projeto de Lei 69/25, que quer tornar o estelionato sentimental um crime específico, com penas mais duras (de 3 a 8 anos), especialmente em casos envolvendo perfis falsos ou vítimas idosas.
E agora?
O mandado de prisão preventiva foi expedido pela Vara de Violência Doméstica de Feira de Santana, com base no risco de que ele voltasse a agir e na dificuldade de localizá-lo, já que vivia se mudando de estado.
Para a delegada Lorena Almeida, a prisão é uma resposta necessária: “Ele demonstrava alto grau de manipulação e transitava entre estados aplicando golpes em mulheres. Foi uma ação fundamental para impedir que outras vítimas fossem enganadas”.
O suspeito está custodiado e à disposição da Justiça. As investigações continuam para encontrar novas vítimas e tentar recuperar os valores desviados.
Como se proteger
Se você desconfia de um relacionamento virtual, fique atenta a alguns sinais: declarações de amor muito rápidas, relutância em encontrar pessoalmente, histórias tristes que terminam com pedidos de dinheiro, e perfis nas redes sociais que parecem perfeitos demais.
Jamais envie dinheiro para alguém que você conheceu só pela internet. Evite compartilhar informações bancárias e, se algo parecer estranho, fale com amigos de confiança. Se você ou alguém próximo foi vítima, denuncie — delegacias especializadas estão preparadas para ajudar, e o Disque 180 garante sigilo total.
A DEAM de Feira de Santana reforça seu compromisso na luta contra a violência contra a mulher, em todas as suas formas.