Um marco histórico na medicina foi alcançado com a primeira cirurgia em um ser humano realizada por um robô de forma totalmente autônoma, sem qualquer intervenção de profissionais médicos. O procedimento, uma complexa remoção de vesícula biliar, foi conduzido pelo sistema, que demonstrou capacidade de aprendizado e adaptação em tempo real. O desenvolvimento é fruto de um projeto financiado pelo governo federal dos Estados Unidos e liderado pela Universidade Johns Hopkins.
Tecnologia Avançada em Ação
O robô cirúrgico, batizado de Surgical Robot Transformer-Hierarchy (SRT-H), foi submetido a um treinamento intensivo baseado em vídeos de cirurgias reais. Durante a operação, a máquina interagiu com a equipe por meio de comandos de voz, assimilando informações e ajustando suas ações de maneira similar a um cirurgião em fase de aprendizado, conforme detalhado por pesquisadores do EurekAlert.
Testes realizados revelaram que o SRT-H alcançou um nível de perícia comparável ao de cirurgiões humanos experientes, mesmo diante de situações inesperadas, mas comuns em emergências médicas. O sistema também se adaptou a variações anatômicas do paciente em tempo real e corrigiu desvios automaticamente, inclusive quando a posição inicial do dispositivo foi alterada ou quando corantes similares a sangue foram adicionados, modificando a aparência dos tecidos.
“Este avanço nos move de robôs que podem executar tarefas cirúrgicas específicas para robôs que realmente entendem os procedimentos cirúrgicos”, afirmou o roboticista médico Axel Krieger, ressaltando a relevância do feito.
Evolução da Autonomia Cirúrgica
A pesquisa, cujos resultados foram divulgados na revista Science Robotics nesta quarta-feira (9), representa um salto significativo em relação a estudos anteriores. Em 2022, o robô STAR (Smart Tissue Autonomous Robot), também desenvolvido por Krieger, realizou uma cirurgia laparoscópica em um porco vivo, mas o procedimento exigiu o uso de tecidos marcados e um ambiente altamente controlado, seguindo um plano pré-determinado.
Diferente de seu antecessor, o SRT-H opera com uma arquitetura similar à do ChatGPT, da OpenAI, permitindo interatividade e resposta a comandos de voz como “agarre a cabeça da vesícula biliar” ou correções como “mover o braço esquerdo um pouco para a esquerda”. Essa capacidade de aprendizado contínuo com o feedback humano confere ao novo sistema uma versatilidade sem precedentes.
Ji Woong “Brian” Kim, principal autor do estudo e ex-pesquisador da Johns Hopkins, atualmente na Universidade de Stanford, destacou que o trabalho “mostra que os modelos de IA podem ser confiáveis o suficiente para a autonomia cirúrgica – algo que, antes, parecia distante, mas, agora, é comprovadamente viável.”
Complexidade e Próximos Passos
Antes da remoção da vesícula biliar, que envolve 17 procedimentos de longo prazo, o SRT-H já havia sido treinado em tarefas cirúrgicas básicas como manipular agulhas, levantar tecido corporal e suturar. A cirurgia da vesícula biliar, no entanto, exigiu a identificação precisa de dutos e artérias, colocação estratégica de clipes e o corte de partes do corpo com tesouras. O robô conseguiu executar tudo com precisão apenas observando vídeos de operações realizadas por cirurgiões da Johns Hopkins em cadáveres de porcos.
O cirurgião Jeff Jopling, coautor do projeto pela Johns Hopkins, comparou o processo ao treinamento de residentes, afirmando que “este trabalho ilustra a promessa de desenvolver sistemas robóticos autônomos de maneira semelhante modular e progressivamente.”
A equipe responsável pelo SRT-H planeja agora expandir os treinamentos e testes para outros tipos de cirurgias, buscando aprimorar ainda mais as capacidades do robô para futuras intervenções cirúrgicas totalmente autônomas.