A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) concedeu, nesta terça-feira (1º), a autorização para o início dos ensaios clínicos em seres humanos da primeira vacina brasileira desenvolvida especificamente para combater a gripe aviária. Este passo representa um avanço significativo na preparação do país para possíveis cenários pandêmicos.
O imunizante, que tem o Instituto Butantan, em São Paulo, como responsável pelo desenvolvimento e condução dos estudos, está em fase de criação desde janeiro de 2023. A tecnologia utilizada é a mesma empregada na vacina contra a influenza sazonal. Os estudos pré-clínicos, realizados em animais, demonstraram resultados positivos em relação à segurança e à capacidade de gerar resposta imune.
Prevenção de Pandemias
Embora a transmissão da gripe aviária para humanos seja considerada esporádica, o Butantan enfatiza a importância de preparar o Brasil para potenciais pandemias, utilizando as lições aprendidas com a Covid-19. Especialistas de saúde do instituto e de outras instituições brasileiras alertam para o elevado potencial pandêmico da doença, especialmente do subtipo H5N1, que apresenta uma taxa de letalidade de 50% em humanos.
O objetivo do Butantan é estabelecer um estoque estratégico de vacinas, com doses elaboradas a partir de três cepas vacinais distintas, fornecidas pelos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos e pelo Instituto Nacional de Controle e Padrões Biológicos (NIBSC) do Reino Unido, após acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS). As cepas são:
- Influenza aviária A/Anhui/1/2005 (H5N1);
- Influenza aviária A/Astrakhan/3212/2020 (H5N8);
- Influenza aviária A/duck/Vietnam/NCVD-1584/2012 (H5N1).
Fases dos Testes Clínicos
O imunizante em estudo, uma vacina influenza monovalente A (H5N8) inativada, fragmentada e adjuvada, será administrado em duas doses, com intervalo de 21 dias, e seguirá duas etapas principais. Inicialmente, os testes incluirão adultos na faixa etária de 18 a 59 anos e 11 meses. Posteriormente, a pesquisa será expandida para indivíduos com 60 anos ou mais.
O Instituto Butantan prevê recrutar 700 voluntários, entre adultos e idosos, para as fases 1 e 2 dos ensaios, que serão conduzidos em cinco centros de pesquisa distribuídos pelo país. O acompanhamento desses participantes está programado para ser concluído em 2026, quando então o Butantan enviará à Anvisa o pacote regulatório completo, abrangendo uma ampla faixa etária para a vacina.
“Estamos em conversas com o Ministério da Saúde, que se mostrou sensível ao avanço dessa discussão. Com a plataforma aprovada, o Instituto pode produzir um contingente de 30 milhões de doses após os resultados iniciais. Este contingente estratégico pode ser utilizado caso o vírus comece a se disseminar entre humanos e tenha antígenos semelhantes aos representados pela vacina candidata do Instituto Butantan”, afirmou Esper Kallás, diretor do Instituto Butantan.
A avaliação da segurança e da capacidade de induzir resposta imune em duas formulações do imunizante, comparadas a um placebo, será o foco dessas etapas. Um comitê independente de monitoramento de dados e segurança acompanhará a pesquisa, avaliando a segurança dos primeiros 70 voluntários adultos após a primeira dose. Caso a análise seja positiva, haverá novo recrutamento para incluir mais 280 adultos. Após esta fase, com perfil de segurança favorável, a segunda fase do estudo começará com 70 voluntários com 60 anos ou mais. Se os resultados forem positivos, mais indivíduos dessa faixa etária serão convocados, até atingir um total de 350 voluntários.
“Ter uma vacina pronta, com uma plataforma já testada, que mostra que produz anticorpos contra o vírus, é o objetivo do Butantan. Não é para já comercializar, mas para propor um estoque estratégico”, concluiu Kallás.
Situação da Gripe Aviária no Brasil
O Brasil declarou-se livre da gripe aviária em 18 de junho, após um período de 28 dias sem novos registros em granjas. A contagem teve início em 22 de maio, com a desinfecção completa de uma granja em Montenegro, no Rio Grande do Sul, local do primeiro e único foco da doença em aves comerciais no país.
Como o maior exportador de carne de frango do mundo, o Brasil enfrentou restrições comerciais impostas por 16 países após a notificação do primeiro caso no Rio Grande do Sul. Com o controle da situação, a maioria dessas medidas já foi revista. Atualmente, apenas o Japão mantém restrições à importação de carne de frango de alguns municípios específicos: Montenegro, no Rio Grande do Sul; Campinápolis, em Mato Grosso; e Santo Antônio da Barra, em Goiás.